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terça-feira, 26 de setembro de 2017

Expropriado (ou 100 Sonhos)




Nada há o que comungar e nada a partilhar
Entre o Eu e os amplos espaços vazios da minha compreensão.
Há os grandes hiatos abertos 
Em meus ossos quebrados por palavras
Em meu espírito fragmentado por pedras e paus...

Um dia hei – e na ânsia desse dia, já nem como ou durmo senão em sonhos-
De livrar-me desse entorpecimento dos sentidos
Dessa fuga de pensamentos que correm em avalancha
Como se não tivesse crânio a detê-los, mas apenas o céu por teto para o cérebro.
Por certo, deveria perder-me no acaso dos caminhos que aponto
Nas direções que indico, mas nunca tomo, 
Como se a trilha para a minha alma caminhar
Começasse na ponta do meu indicador.
Todos parecem saber, mas eu...Eu não compreendo...

Mas tem uns fantasmas falando com minha voz,
Monólogos maçantes em que debato comigo mesmo e com meus medos.
Pavores absurdos, pueris, pesadelos que já nem assustam tanto
Quanto a consciência da súbita perda da capacidade
De me assustar.

Tem dois abismos doces por detrás de suas pupilas...
Há dois demônios graciosos a espreita nas suas pálpebras...
Há néctar e veneno confundidos na curva dos seus lábios...
E enquanto me corre um rio de água gelada pelo estômago,
Sorrio de volta para o inferno – Para o maravilhoso e encantador inferno!
E penso o que pensa a vidraça ao beijo da pedra:
Isso vai doer!

Devo, em meu devir repleto de reminiscências
Expropriar-me de imaginações e sepultar em baús os devaneios
Não tardará romper o dia e há tributos a serem pagos
A tudo e a todos e a corrida do mundo não toma fôlego.

Sonhos são dinheiro precioso.
Já cá, ando sem moeda alguma que jogar no Arrudas
Em troca de um desejo.
Um único.

segunda-feira, 25 de setembro de 2017

Minha Dialética Tardia...




"A luta entre o velho e o novo, entre o que morre e o que nasce, entre o que é perene e o que evolui...
A luta dos contrários é,pois, o motor de toda a mudança."

Eu pensei que queimaria a mim mesmo na fogueira das minhas vaidades. Nunca soube de lenha mais adequada.

Isso seria um desejo mais realizável do que meu antigo anseio de ser uma lanterna para o mundo. Ou talvez apenas me tenha escapado o fato de que são desejos sinonimizados.

Mas, oh, clichês a parte, a chama ardeu alto, mas por tão pouco tempo que nem chegou a iluminar a mim mesmo ou a noite escura a minha volta. E eu cai de tão alto que já nem havia ossos na casca frágil que se rompeu de encontro as rochas..

De que é que poderia me envaidecer, eu, com a consciência aguda das minhas limitações físicas e metafisicas, estéticas e éticas, morais e acadêmicas e de outras ordens e desordens?

Eu olho para trás e vejo com antipatia e compaixão o garoto que fui há tão perdidos anos e para um pouco a frente, com temor do julgamento do velho que serei.

Paradoxalmente, sou ainda aquele garoto com ideias tão revolucionárias quanto efêmeras e também já aquele ancião repleto de cansaço e nostalgia que está há alguns outonos a frente, no horizonte do meu destino.

Há coisas inconfessáveis, que perturbam o suposto da minha maturidade, em numero similar aos constrangimentos antigos da minha meninice.

O entusiasmo sufocante por coisas que eu julgava tão apagadas em mim como a chama da minha vaidade fenecida me inquieta e tenho de me mexer.

De repente me brotam versos e trovas vindas de algum lugar, inspirada por estrelas em ascensão, quando minha alma já caiu no escuro de algum canto onde o mofo e bolor tirou-lhe o brilho..

Ah, melodrama do diabo!
Me sinto antigo e apaixonado por coisas novas, um dinossauro procurando sua versão .2 em smartphones...
Me sinto ridículo, com uns impulsos que brigam com meu desejo de imobilidade e sou ultrapassado até pela minha letargia.

Um corvo errante berra seu “Never more” e eu passo as horas tentando escrever e dar sentido à sujeira que seu pouso deixou no encosto da minha cadeira e na minha consciência...

Me releio em coisas esquecidas e lembradas, umas com ternura, outras com embaraço e rio de mim mesmo, em gargalhadas sufocadas pelo pensamento de que em alguns anos provavelmente estarei rindo deste Sahge/2017...


Talvez eu esteja mesmo é com receio de que a decadência não seja afinal tão romântica quanto a quer o meu niilismo...

Poema Breve 2


...Vê, o vento sopra, é sinal de que o céu se inquieta.
Observa-o agitar-se  no léu e deleite a sua alma.
Se bafeja nas velas da sua nau, significa que você será levado para lá,
Para os horizontes vermelhos em que deseja ardentemente se perder.

Se em direção contrária -  posto que o vento é belo porque é livre -
Então para aquela modorrenta calmaria sem ondas,
Você dirá adeus ao vento e horizontes prometidos e estará também livre,
Livre como o viajante sem estradas e como o pássaro aconchegado à gaiola
Livre do desejo de se perder.
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